20 de setembro de 2024

Ele perdeu

Pedalei até o encontro, era um dia calmo e tudo que eu queria era vê-lo. Meu coração em chamas ardia de paixão, numa intensidade que eu já não sentia a muito tempo. Eu estava totalmente encantado pelo pouco que ele me oferecia. Quando cheguei percebi que ele estava desenhando algo, de longe eu percebi que era um homem de camisa listrada, barba, cabelos bagunçados, parecia estar com as mãos sobre uma mesa e a cabeça inclinada dava a entender que estava usando o celular.

Eu sentei na cadeira e logo ele escondeu o desenho fechando o caderno:

- Oi, que bom te ver de novo - eu disse sem me importar com o movimento, talvez fosse algum projeto dos seus quadrinhos.

Ele me respondeu com um sorriso, um abraço e um leve beijo.

Era a minha primeira vez naquele lugar e eu resolvi dar uma olhada ao meu redor, encontrando numa mesa um pouco a frente um homem sozinho de camisa listrada, barba, cabelos bagunçados, com a cabeça baixa fazendo alguma coisa no celular. Ele estava desenhando aquele homem. Era óbvio que ele não estava apenas desenhando um de seus personagens e sim alguém que ele achou interessante. Perceber isso foi como ter algo atravessando dentro do meu corpo, algo que me fazia perceber que tudo aquilo que eu sentia talvez não fosse correspondido. Para me enganar eu pensei que aquilo era apenas algo comum na vida dele, mas no fundo eu sabia que ele talvez se apaixonasse rapidamente por pessoas que não acham ele atraente, ou pessoas que nunca iriam cruzar o caminho dele. Provavelmente ele usaria a tática manjada de fitar a pessoa com o olhar, de modo que a pessoa percebesse e talvez até ficasse incomodada, mas dando um leve sorriso aquilo era um flerte que para ele funcionava com algumas pessoas. Talvez tenha funcionado comigo, e para falar a verdade eu acho que foi dessa forma que eu me senti fisgado.

Por mais que eu não pudesse exigir algo, aquilo não me parecia 'certo'. Apesar de eu e ele sermos duas pessoas solteiras, que estavam se conhecendo, eu não sentia que tudo que estava dentro de mim era vazio. Talvez fosse eu me enganando mais uma vez, vendo coisas óbvias de mais, de que tudo aquilo não daria certo, de que eu iria me magoar e ficar completamente arrasado por gostar de alguém, como sempre foi. Mas ele havia dito que era diferente, completa mentira, todos que são do mesmo signo que ele são completamente iguais, só mudam os objetivos. Alguns são gananciosos e interesseiros, outros são ardilosos, porém algo em comum a todos é a irresponsabilidade, a comunicação ambígua, a mentira, a incapacidade de ser direto e dizer 'não te quero'.

Enquanto eu festejava o fato do rumo da minha vida ter encontrado alguém como ele, ele se sentia triste mesmo tendo muitas pessoas ao teu redor. Eu celebrava e sonhava a única flor que eu encontrei, enquanto ele chorava e beijava muitas pessoas.

Ele é um idiota, um grande idiota, um dos maiores idiotas que já conheci. E não foi por desatenção minha, foi por achar que eu deveria ignorar os sinais mais óbvio que todos os idiotas convictos dão. Ele é um idiota, que poderia ser feliz comigo, mas ele prefere ser triste, prefere ser triste e buscar mais tristeza, prefere ser triste e viver um grande caos, um idiota que não apendeu com os erros.